Publicado em 26 de junho de 2025
Quando as pessoas pensam em uma clínica de tratamento renal, a primeira imagem que vem à mente é quase sempre a da máquina de hemodiálise. Elas pensam nos números, nos exames, na dieta restrita e nas longas horas de tratamento. E tudo isso é, sem dúvida, uma parte crucial da jornada. Mas e a vida que acontece entre uma sessão de diálise e outra? E a vida que acontece durante elas?
É exatamente aí que eu entro. Como terapeuta ocupacional (ou T.O., para facilitar), meu foco não está na doença renal em si, mas na pessoa que convive com ela. Minha pergunta fundamental é: "Como podemos fazer com que seu dia a dia, suas atividades e suas paixões continuem a ter sentido, mesmo com os desafios impostos pelo tratamento?".
Meu trabalho é uma parceria. Eu atuo diretamente com os pacientes para construir um cotidiano mais funcional, autônomo e, acima de tudo, significativo. Veja como isso acontece na prática:
1. Gerenciando a Energia (que parece sempre curta!) 🔋
A fadiga é, talvez, o sintoma mais impactante e invisível da doença renal crônica. Minha primeira missão é ajudar o paciente a se tornar um mestre em conservação de energia. Nós analisamos juntos a rotina diária e identificamos onde a energia está sendo "desperdiçada". A partir daí, traçamos estratégias:
- Planejamento: Organizar a semana para que tarefas pesadas (como limpar a casa) sejam feitas nos dias de maior disposição, e não na véspera da diálise.
- Adaptação de tarefas: Cozinhar sentado, usar um carrinho para levar as compras, tomar banho usando um banco de apoio. São pequenas mudanças que fazem uma diferença gigantesca no fim do dia.
- Priorização: O que é realmente importante fazer hoje? Ajudamos a focar no que traz mais alegria e bem-estar.
2. Ressignificando o Tempo na Diálise 💡
Três, quatro, cinco horas, várias vezes por semana, conectado a uma máquina. Esse tempo não precisa ser um tempo perdido. Meu papel é explorar com o paciente o que pode ser feito para tornar esse momento mais produtivo ou relaxante. Algumas ideias que trabalhamos:
- Leitura, ouvir podcasts ou audiobooks.
- Realizar exercícios leves para as mãos e braços (sempre respeitando o acesso vascular!).
- Planejar a semana, organizar listas.
- Aprender algo novo através de apps no celular ou tablet.
- Praticar técnicas de relaxamento e meditação guiada.
3. Cuidando das Mãos e do Corpo 💪
Muitos pacientes sentem cãibras, inchaço (edema) e perda de força nas mãos. Atuamos diretamente para:
- Prevenir deformidades e manter a função: Com exercícios específicos de fortalecimento e alongamento.
- Cuidar do acesso vascular (fístula): Orientando sobre os cuidados essenciais no dia a dia para proteger esse acesso vital, como evitar carregar peso ou usar roupas apertadas.
- Adaptar objetos: Engrossar o cabo da escova de dentes ou dos talheres para facilitar a pegada, por exemplo.
4. Resgatando Papéis e Paixões ❤️
A doença renal pode forçar uma pessoa a se afastar do trabalho, de hobbies e do convívio social. Isso gera um sentimento de perda de identidade. Meu objetivo é lutar contra isso.
- Retorno ao trabalho: Se for o desejo do paciente, analisamos as demandas do seu trabalho e pensamos em adaptações ou estratégias para viabilizar um retorno seguro.
- Lazer e tempo livre: Qual era sua paixão antes do tratamento? Pintar? Cuidar de plantas? Cozinhar? Nós encontramos maneiras de adaptar essas atividades. Se um jardim grande não é mais viável, que tal uma horta vertical na varanda? Se ficar horas em pé na cozinha é cansativo, como podemos adaptar as receitas e o ambiente?
- Participação Social: Incentivamos e facilitamos a participação em grupos, o encontro com amigos e a manutenção de laços familiares, que são essenciais para a saúde mental.
Em resumo, enquanto a equipe de nefrologia e enfermagem garante que os rins do paciente recebam o melhor tratamento, eu, como terapeuta ocupacional, garanto que a pessoa não se perca no processo. Meu trabalho é construir pontes entre o tratamento e a vida, transformando o "paciente renal" novamente em João, que adora pescar; em Maria, que ama cuidar dos netos; em Carlos, que sonha em voltar a fotografar.
Porque a vida é muito mais do que tratar uma doença. É sobre vivê-la plenamente, em qualquer circunstância. ✨